Crase proibida
É muito comum o brasileiro
sofrer com o acento grave, sinal que serve para indicar crase, ou seja, a fusão
de “a + a”. Ele é apenas um sinalzinho com inclinação à esquerda, tem seus
encantos, porém deixa muita gente boa em situação delicada. Para quem a entende
e sabe usá-la, rapidamente reconhece a importância de tal acento, esclarecendo
sentidos e funções.
Falar do acento agudo e do
circunflexo, como na nova ortografia da língua portuguesa, é coisa bastante
distinta de falar do acento grave. Razões muito diferentes justificam a
existência deles. Abole-se um acento agudo aqui, um circunflexo lá, mas o grave
tem vida longa garantida. A crase é eminentemente sintática, exige noções de
regência e bom conhecimento morfológico do artigo e da preposição. Acentuar uma
proparoxítona (lâmpada) e acentuar um objeto indireto (referi-me à nova lei)
exige esforços cognitivos diferentes.
Quando alguém pergunta como
faz para aprender a “crasear”, a dica é para começar pelo avesso: primeiro
aprenda a não colocar o acento em lugar proibido. Há certas construções em que
ele não cabe, pois falta metade: um dos “a + a” não comparece. Por exemplo, o
artigo definido feminino “a” não pode ser usado em determinadas situações, o
que, por exclusão, nos leva ao raciocínio de que o “a” da construção é apenas a
preposição “a”.
Em todas as situações a
seguir, não insista, o acento é proibido, pois o artigo definido feminino “a”
não pode aparecer. Assim, não ocorre
crase antes de:
a) substantivo masculino: foi a júri, falei a respeito, ir a bordo, a pé, operação a laser
b) “a” no singular + palavra
no plural: a folhas, a duras penas,
referiu-se a pessoas
c) artigo indefinido uma: falei a uma pessoa, referi-me a uma lei
d) pronomes pessoais, a ti, : falei a ela, a mim a nós
e) os seguintes pronomes
indefinidos: falei a ninguém, enviei a
pouca gente, referi-me a toda pessoa, a qualquer pessoa, a cada pessoa, não
falei a nenhuma pessoa, falei a alguma pessoa, falei a muita gente, falei a bastante
gente, falei a alguém
f) os pronomes demonstrativos
esta e essa: falei a esta pessoa,
referi-me a essa lei
g) verbo infinitivo: a partir de, a combinar, a começar
h) pronomes de tratamento
iniciados por Vossa ou Sua: falei a
Vossa Senhoria, requer a Vossa Excelência
i) pronome de tratamento você: falei a você
j) pronome cujo: vi a pessoa a cujo caráter fizemos alusão
k) pronome quem: vi a pessoa a quem você diz obedecer
Também não ocorre crase em
expressões em que usamos palavras repetidas: face a face, cara a cara. A
memorização dessa lista é decisiva para que não sejam cometidas as falhas mais
primárias em relação ao acento grave.
Nas provas de concursos
públicos, essa área proibida de crase comparece com frequência. Em todos os
trechos abaixo, destacamos o “a” com
falha.
Procure mentalizar por que o acento está
errado.
1) (ESAF) como um instrumento
de poder à favor dos capitais
2) (ESAF) no que tange à doenças ocupacionais
3) (VUNESP) vou narrar à Vossa Excelência
4) (VUNESP) deixe o carro na
garagem e ande à pé
5) (VUNESP) Pôs-se à chorar
6) (FCC) sempre sujeitas à alguma revisão
7) (FCC) Quando à cada nova obrigação
8) (FCC) Se fosse a mim, e não
à ela
Fique atento e evite erros
básicos como os dois exemplos seguintes, retirados de publicações de jornais:
Inglês à jato
Manuscritos de Drummond vão à leilão
Os substantivos “jato” e
“leilão” são masculinos e, antes de palavra masculina, antes de palavra
“macho”, o acento grave é proibido.